A 7 e 8 de janeiro de 2023, a Associação AZtrail realizou a quarta edição do Vouga Trail, em Sever do Vouga, capital do mirtilo.
Este ano, o Vouga Trail contemplou o Campeonato Nacional de Trail Ultra, prova realizada em parceria com a ATRP (Associação de Trail Running de Portugal), com a participação dos melhores atletas nacionais.
O evento decorreu em dois dias, sendo que no sábado, dia 7, decorreu o Campeonato Nacional de Trail Ultra bem como a prova aberta na mesma distância: 55 km's, com desnível D+2500 metros. O Vouga Kids realizou-se, também, neste dia.
Já no dia seguinte decorreram o Vouga Trail Longo (35km) com D+1500; o Vouga Trail Curto (25km) com D+1000 e Vouga Mini Trail (15km que afinal foram 18km's) com D+600. Em simultâneo com estas distâncias competitivas, realizou-se uma caminhada.
As minhas expectativas
A semana apesentou-se solarenga, céu azul e sol de Inverno que aquece a alma. Contudo, ou não fosse praxe do Vouga Trail, as previsões do fim de semana apontavam para, resumidamente, temporal. Como tal, o dia amanheceu com muita chuvinha.
Durante a manhã estive sempre com o olho nos resultados ao vivo bem como, posteriormente, na live feita pela ATRP. Quando digo que vibro com este desporto, vibro de facto. E portanto estava a seguir atentamente não só o Campeonato mas também a prova aberta porque, por muito lixo que as redes sociais nos tragam, também nos trazem pessoas lindas que chegam e trazem arco-íris com elas.
A ideia era, pelas 17 horas, ir levantar o meu dorsal e o do Marco que, mais uma vez, me acompanhou na prova, obrigada, nunca terei palavras suficientes para te agradecer. És um dos arco-íris que as redes sociais trouxe. No entanto, pouco depois de almoço já não conseguia estar em casa.
A caminho de Sever do Vouga, ainda parei na ecopista e fui até à Encosta dos Túneis, vi alguns atletas mas, a chover como estava, rapidamente percebi que não era sítio para estar. Decidi ir para a arena de prova. Vi a cerimónia de entrega de prémios e ainda dei os parabéns a alguns atletas que admiro e que são provas de resiliência. Quando for grande quero ser como eles: o Hugo Gonçalves, Nelson Graça, a Inês João que considero sempre de uma humildade e simplicidades lindas de ser ver, entre muitos outros. Ainda com a cerimónia a decorrer, vendo as horas, decidi ir para junto da meta… os atletas iam chegando… sabia que o Miguel Moura andava por lá, vi a chegada do André, do Renato, da Margarida, … a chuva não dava tréguas, pelo contrário, piorou, o vento uivava, as horas iam somando e eu só pensava no quanto admiro a determinação e força destas pessoas, tantas horas ali, a correr, a caminhar, a desafiar-se debaixo de chuva e frio. Tinha prometido esperar por um amigo e foi o que fiz e foi muito bom vê-lo chegar, o orgulho, a alegria que senti por ele, … parabéns :)
Posto este dia de emoções fortes, levantados os dorsais, rumei a casa. Jantar pizza com o belo do copinho de tinto com o Marco :D e xixi cama.
Dia de prova
Quem anda por aqui já sabe que eu sofro de nervos crónicos no pré prova e portanto, como não podia deixar de ser e face ao que tenho treinado, lesões, plena consciência de estar em baixo de forma, distância que em nada me é confortável e estado do tempo, só podia ter passado uma noite pouco tranquila e ter acordado com o coração a mil… o caminho foi feito entre coração na boca e inspirações longas. Mais uma vez afaga-nos a alma encontrar pessoas amigas de outros desafios destes.
Às 9h30 é dada a partida. Começamos logo a subir por Sever do Vouga e entramos nos trilhos pouco passava de 1km de prova. Lembro-me que no ano passado, quando fiz a distância de 15kms fiz esta subida sempre a correr, claro que este ano isso não aconteceu.
Aquela chuvinha miudinha, o terreno escurecido, a terra completamente mexida de tantos pés que lá passaram das distâncias antes de nós... Em algumas zonas a terra parecia que expelia água.
A partir dos 4 km's voltamos a subir mas a subida mais quebra pernas e motivação foi mesmo dos 11 aos cerca de 13,5 kms. Sendo que a minha quebra foi, exatamente, por volta dos 11 km's. Portanto, foi um constante contrariar-me a mim própria e continuar, quando já me doíam as costas (eu tenho hipertrofia zigapofisária e desidratação dos discos e portanto aquela posição meia inclinada e má postura de muito tempo a subir dá-me cabo das costas e, inevitavelmente, começam a doer).
Os cursos de água que fomos passando, quer em paralelo, quer mesmo tendo que os atravessar tinham muito mais volume de água e agressividade do que aquilo que é costume. Entre os atletas imperava silêncio, só o instrumental produzido pela natureza reinava. A lama, e mais lama e outra vez lama, os pés deslizavam, os bate-cus eram frequentes (só caí uma vez :D), a dada altura senti que os pés enterravam de tal forma que não sabia quando ia ficar sem sapatilhas. Pés sempre molhados. Muito frio. Os trilhos desta prova são só fenomenais, as cascatas sempre presentes, os inúmeros single tracks, todos aquelas passagens pelas margens do rio e depois claro, a fenomenal Cascata da Cabreia que, neste dia, tinha uma imponência maior do que aquela que já lhe reconheço.
Ainda sobre água, de referir que, um ponto menos positivo, em algumas travessias de água, estando como referi o rio com corrente muito forte, tornou-se complicada a travessia e não haviam cordas, bombeiros, organização, nada. Valeram os atletas que foram parando e ajudando, pondo a malta a fazer cordão de mãos dadas. Se estivesse sozinha, não atravessaria devido à força da corrente que era maior que a minha própria força associada ao meu terror pela água.
Já não sei se eram os trilhos que eram técnicos ou se as condições climatéricas bem como todo o calcado que já tinham os fizeram técnicos. O sobe e desce foi constante.
Impossível não referir o alojamento que vim a saber depois se trata do Moleiro da Costa Má que me deixou deslumbrada, um casa ali no meio, completamente envidraçada, sem vizinhos, só ali no meio da natureza quase a comungar com ela. Passava ali 3 dias de retiro, fácil :D
Parei no abastecimento dos 18km's, nessa altura já vínhamos a descer e sabia que continuaria a descer até ao final.
Finalmente vejo o Lidl e penso, ok, está quase mas voltamos a entrar em trilho e já estava muito mais que saturada. Sempre a pensar como é que a malta que faz 55 km's consegue que a mente não os sabote. Sempre a passar em poças e mais poças de água e lama mais lama.
Chegada ao fim, apesar do sofrimento, resmunguice, frio, há que reconhecer que havia também uma pontinha de orgulho, esta é daquelas provas que trazem sempre uma sensação de vitória por se chegar ao fim, quanto mais não seja tendo em conta as condições meteorológicas.
Resta-me dar os parabéns a todos os que se superaram, a todos os que saíram de casa para ir à prova mesmo que não a tenham terminado e, claro, a todos os que foram ao pódio.
Resultados Gerais
Campeonato Nacional Ultra Trail
Masculinos
1º André Rodrigues, EDV-Viana Trail - 04:56:20.463
2º Miguel Arsénio, EDV-Viana Trail - 05:03:12.513
3º Bruno Silva, Furfor Running Project - 05:07:10.047
Femininos 1ª Inês João, Saca Trilhos Anadia 06:02:21.157
2ª Ercília Machado, OCS - Arrábida Trail Team - 06:08:05.817
3ª Cristina Arreiol, Furfor Running Project - 06:11:37.080
Ultra Trail
Masculinos
1º Pedro Garrido, OPraticante.PT - 05:46:11.410
2º Marcelo Araújo, Lusavouga Trail Running - 06:04:45.957
3º João Pimenta - 06:16:03.303
Femininos
1ª Aroa Sio, Craft Sportswear - 06:34:16.890
2ª Andreia Pita, ARCD Venda da Luísa - 08:02:58.973
3ª Marta Abrantes, Runner da Frente Ribeirinha da Póvoa de Santa Iria - 08:13:07.047
Trail Longo
Masculinos
1º António Pereira, Linces do Marão - 03:11:59.763
2º Tiago Matias, Clube Académico de Penafirme - 03:14:30.573
3º Ricardo Crespo, Associação Desportiva Castelo de Vide - 03:23:54.060
Femininos
1ª Carolina Oliveira, Furfor Running Project - 04:04:42.337
2ª Diana Elias, Porto de Mós a Correr - 04:08:25.117
3ª Beatriz Alves, Furfor Running Project - 04:10:22.923
Trail Curto
Masculinos
1º Tiago Vieira, Furfor Running Project - 02:15:50.067
2º Hélder Lopes, DCI / Trilhos Luso Bussaco - 02:16:58.873
3º Tiago Duarte, Atletismo Clube da Tocha - 02:18:23.050
Femininos
1ª Célia Amaro, Serra D´Aire Trail Team - 03:01:58.560
2ª Liliana Cardoso, Clube Desportivo Feirense - 03:10:51.107
3ª Marta Moreira, Associação Desportiva Nós Acreditamos - 03:14:22.877
Mini Trail
Masculinos
1º Nelson Loureiro, OPraticante.PT - 01:42:26.637
2º João Freitas, Vikings Trail Runners/CCRAlcabideque - 01:53:57.413
3º Eduardo Costa, AGM Team Running - 01:54:45.290
Femininos
1ª Márcia Martins, DCI / Trilhos Luso Bussaco - 02:29:23.247
2ª Carolina Gregório, Hero Team - 02:32:22.007
3ª Marta Gomes, SPORTARC - 02:43:08.550
Texto: Sílvia Gomes
Fotografias: Samuel Frítz; ATRP; Vouga Trail; Matias Novo.
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